domingo, 27 de dezembro de 2009

Extensões


Depois de algum tempo, aceitou abrir os olhos.
Era uma daquelas tardes embriagantes. O sol quebrava a coluna do céu em seu exímio brilho eterno. A mente ainda possuía lembranças. Erguia levemente a cabeça. Declinava o olhar buscando a tangente das cores inevitavelmente saborosas. Permitia-se a toda e qualquer interpretação. Ousava o caminhar surdo e lento.

Retirava os cabelos dos olhos e surpreendia-se a cada piscar. Entre as árvores que produziam a alameda pela qual seguia, ele ainda podia curtir os níveis de perspectiva que (aqui e agora) seus olhos faziam descrever. Ao horizonte distante, estava certo que seria essa a simples beleza das ordinárias tardes de sol.

Porém, mesmo completo faltava.

Foi então que propositalmente ela apareceu. Era senhora dos clichês românticos. Corria desmanchando todo equilibro rítmico do seu coração. Ele não se importava. Com ela, a falta era completa.

O concerto natural da beleza de olhar os brilhos que compõem o cenário lúdico de suas rememorações infantis eram todos eximidos a favor do simples perfume de seu sorriso. E então, permitia-se mais. Sua interpretação das coisas se reduzia. Limitava-se. Tornava-se única. Ela. Ao horizonte mais próximo de tudo - os olhos dela - ele, novamente, estava certo que seria simples a beleza das extraordinárias paixões de verão. O sublime não lhe fazia parte. Não lhe era digno.

Assim como o pouco espaço de suas palavras todas em ordem de pensamento. Desejava que ao menos elas, fossem eternas. Pois tudo, ele sabia, havia de se acabar. Como aquele sonho. Em segundos, ao se dar conta do sonho bom. Abriu os olhos. Reconheceu a inércia das madrugadas frias em que se transformara sua rotina. Moveu levemente à direita sua cabeça. Fitou a parede branca, as outras camas brancas. Alguns gritos que representavam a realidade.

Sonhos são piadas de mau gosto, debocham de mim. Resignou-se em aceitar que as ironias da vida não obedecem muros, grades ou estados mentais. Não sorriu e, também, naquela noite, não dormiu, o interno da ala B.


4 comentários:

Anônimo disse...

"sem o amargo, o doce não é tão doce"

Claudia R.S disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Claudia R.S disse...

As sinestesias me levaram para a Ala muito próxima.

Carol Sartomen disse...

Lembra-me o "Trem da Vida", exibido no ano passado no Cinema (d)e Horror pela Rosana Zanelatto =)